terça-feira, 12 de abril de 2011

Cidadania



 A vida como cidadão

   O cidadão vive dentro de 4 paredes, rodeadas por outras 4 paredes. Assim estará disposta qualquer Casa num ambiente citadino: rodeada pelas paredes das outras casas, como que sendo Ela uma pessoa, dentro da sua própria casa. Tais casas estarão sempre fechadas, pois ao abrir uma janela, o cidadão verá apenas outro interior: a casa da sua casa, ou seja, o seu próprio ambiente, em que qualquer céu, não tendo pois um horizonte, nunca será mais que um tecto, povoado por moscas com penas. E que cidadão devidamente preocupado não verá afinal as aves como sendo moscas? - as moscas do seu quarto. As suas janelas nunca poderão estar abertas. Elas abrem-se para si mesmas, abrem-se para dentro-de-si e nunca para aquilo que está lá fora; e isto de uma forma tão evidente, que a paisagem que se vê das janelas de uma casa da cidade é composta por janelas de casas.
   Qualquer transeunte apresentar-se-á ao cidadão como alguém inalcançável, por isso ele leva consigo um mini computador-portátil de bolso, com a sua lista de contactos de pessoas alcançáveis, ou antes, as pessoas que existem no seu mundo, na sua rede pessoal. Todas essas pessoas, inexistentes no campo sensorial do cidadão, constituirão o motivo da sua escolha, e o caminho a seguir. O seu motivo nunca será a sua ocupação presente, e tal ocupação resumir-se-á a um andar ligeiro, rumando em direcção ao motivo distante.

   O cidadão está distante daquilo que lhe é presente.
  
O cidadão não cria o seu próprio ambiente, ele desenvolve um ambiente que já foi criado pelos cidadãos que lhe precederam, regindo-se assim pelos valores inerentes ao conceito de cidadania, aos valores portanto, daqueles que já são cidadãos. A cidadania é uma aura do passado que persiste no hoje. É um carimbo que dita o rumo do hoje e que lhe dá um sentido. Mas o hoje alguma vez existiu antes? Então a cidadania traz ao hoje aquilo que não pertence ao hoje. Que deus é esse afinal, que estampa um carimbo no hoje? Que deus é esse que se impõe aos cidadãos? E não revela isto a contradição que existe em todos os que se declaram ateus?

   A cidadania é uma maneira de sermos aquilo que não-somos. É um valor que concede ao homem as características de um animal de estimação. E por muito terreno que tenha, por muita ferocidade que tenha, qual é o cão doméstico que não vive numa “gaiola” a depender do(s) seu(s) deus/deuses?

André Rúben
12/04/2011