A liberdade não é somente aquilo que o entendimento vulgar deixa circular com este nome, a saber, o capricho que ocasionalmente emerge para nos inclinarmos na escolha, para este ou para aquele lado. A liberdade não é o desprendimento quanto ao poder ou não fazer. Mas a liberdade também não é a disponibilidade para o que é exigido e necessário (e assim, de qualquer modo, um ente). A liberdade é, antes de tudo isso (liberdade "negativa" ou "positiva"), a entrega á desocultação do ente enquanto tal.
(...)
O homem não "possui" a liberdade como propriedade, mas, acima de tudo, trata-se do inverso: a liberdade, o ser-aí ek-sistente(*) e desocultante, possui o homem e isto de forma tão originária que só ela concede à humanidade a referência peculiar ao ente no seu todo enquanto tal, que fundamenta toda a história. Só o homem ek-sistente é histórico. A "natureza" não tem história.
A liberdade assim entendida como deixar-ser o ente cumpre e realiza a essência da verdade, no sentido da desocultação do ente. A "verdade" não é nenhuma característica da proposição correcta, que é dita de um "objecto" por um "sujeito" humano e que, então, tem "valor" não se sabe em que âmbito; a verdade, pelo contrário, é a desocultação do ente, por meio da qual a abertura acontece. Todo o comportamento e atitude humanos estão expostos numa tal abertura. Por isso, o homem é segundo o modo da ek-sistencia.
Heidegger, Martin
Sobre a essência da verdade
(*) - a expressão "ek-sistencia" é aqui utilizada para referir a exposição das coisas, como essência em-si, sujeitas á desocultação do seu verdadeiro ente, e não como a sua mera existencia, que está conforme o conhecimento vulgarizado na época.
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